sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Quatro coisas que você não deve dizer a uma pessoa que sofre com depressão: uma análise comportamental

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro

Depressão é coisa séria e ninguém tem nenhuma dúvida a esse respeito. Mas mesmo assim existem muitas pessoas que tratam o problema como se não tivesse nenhuma importância. Como se não bastasse costumam dizer coisas que só pioram a situação de quem já está sofrendo com a depressão. Eis algumas pérolas:

"Vai Passar"
Existe um ditado que diz "que tudo na vida é passageiro, exceto o motorista e o trocador". Não se aplica à depressão. A depressão não é um problema que costuma passar, que desaparece sozinho com o tempo. Aliás, o tempo não é o melhor remédio. Tempo nunca foi remédio pra nada. Agir de modo a mudar a situação, de forma planejada, é claro, é a melhor alternativa. Por isso o autoconhecimento tem um grande valor neste momento. Desta forma, a ajuda de um profissional "Psi" pode ser de grande valia. Não adianta dizer que vai passar. Pode até ser que passe, desde que, aquele/a que sofre com o problema consiga expandir as suas fontes para obtenção de reforçamento. Mas, vida de regra, a pessoa que tem depressão não consegue fazer isso sozinha. Dificilmente ela consegue identificar o que pode ser reforçador.

"É Falta do Que Fazer"
No imaginário coletivo o remédio para a depressão é fazer alguma coisa. Isso certamente tem relação com a sociedade em que vivemos, uma sociedade que deposita no trabalho a esperança para a salvação de todos. O trabalho é a via para a redenção do homem, é o meio para a sua glorificação. Pelo menos é o que pensa uma sociedade centrada na exploração do trabalho como meio para produção de riquezas. Mas você já se perguntou que o fazer alguma coisa, seja ela o que for, é quase nada reforçador para quem sofre com depressão? O não fazer nada, comum à depressão, é um modo de fazer alguma coisa e pode ser uma das poucas fontes de reforçamento facilmente acessíveis para quem tem depressão. Não adianta mandar a pessoa fazer alguma coisa. Não é qualquer fazer que será reforçador. Por isso a importância de buscar ajuda profissional. Junto com o/a profissional a pessoa com depressão pode identificar novas fontes de reforçamento que suplantem os efeitos aversivos dos sentimentos comuns a um quadro depressivo.

"É Frescura"
Depressão não é queijo fresco, aquele que é muito gostoso de comer com goiabada. Aqui em Minas Gerais é uma das sobremesas preferidas dos mineiros. A ideia de frescor consolida a imagem de algo mole, de algo sem muita firmeza. Queijo fresco é mole. Já o queijo curado, o que usamos para fazer o pão de queijo, é duro como um porrete. Precisa ser ralado para que possa ser utilizado na massa. Aquela "moleza" da pessoa com depressão é resultado dos efeitos aversivos dos sentimentos comuns ao quadro depressivo. Sendo assim, o quadro já é suficientemente aversivo, e não é necessário ninguém para torná-lo ainda pior. Evite dizer que é frescura, pois não é. Se não tiver nada melhor pra dizer, fica aqui uma sugestão: não diga nada.


"É Falta de Fé"
Estão aí o Padre Marcelo Rossi e o Padre Fábio de Melo pra provarem que a depressão e outros problemas psicológicos não guardam nenhuma relação com o exercício da fé. Ninguém tem dúvidas de que os dois sacerdotes são homens de muita fé. E lembre-se: a religião não funciona como estímulo reforçador para todas as pessoas. Helloooo, acorde! O que é reforçador para uma pessoa não é para a outra e isso depende da história de vida, ou para ser mais preciso: depende da história de reforçamento de cada um. E o mais importante: religião não é tratamento. O tratamento para a depressão deve ser feito com acompanhamento médico e também psicológico.


De hoje em diante pense duas vezes antes de dizer que a depressão "vai passar, "que é falta do que fazer", "que é frescura" ou que ainda é "falta de fé".
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quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Uma Análise Comportamental da Carência

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Desculpem mais uma vez pelo longo tempo sem realizar nenhuma postagem. Hoje vamos falar um pouco sobre algo que todo mundo já sentiu: carência. Metaforicamente e comportamentalmente a carência é semelhante à fome. Quando estamos com fome qualquer comida parece deliciosa. Quando estamos carentes qualquer relacionamento parece formidável. Mas o que está por trás de tudo isso?

Fome faz com que os alimentos adquiram sabores não notados anteriormente ou nos faz até mesmo comer o que normalmente nós não comemos. Não é muito diferente com os relacionamentos. Carência transforma qualquer relacionamento numa fonte "inesgotável" de realização emocional, até mesmo os relacionamentos com potencial para se tornarem tóxicos.

Existe uma operação comportamental chamada privação que ajuda a entender porque isso acontece. Na privação a impossibilidade de contato com determinado reforço torna mais poderoso o seu efeito reforçador. A carência é marcada pela restrição de acesso a reforçadores condicionados importantes, como, por exemplo, atenção e afeto. Também pode ser marcada pela restrição a reforços de origem sexual, que são exemplos de estímulos reforçadores incondicionados (primários).

Não por acaso a susceptibilidade de entrar em qualquer relacionamento que assinale com a possibilidade de reforçamento. Deste modo, a privação, leia-se carência, eleva a probabilidade  de comportamentos que aumentem as chances de produzirem os reforços que faltam. Daí podem surgir alguns problemas. Um deles é não avaliar com que frequência os reforçadores serão encontrados no novo relacionamento.

Reforços não ocorrem de modo contínuo. Isso é válido principalmente para aqueles que dependem do comportamento de outrem. A depender do relacionamento o esquema de reforçamento pode exigir muitos esforços para que sejam apresentados os estímulos reforçadores. É algo semelhante ao que ocorre nos jogos de azar: o jogador continua jogando mesmo que a probabilidade de vencer seja muito pequena. É neste momento que o relacionamento pode se transformar numa relação tóxica. Muitas fichas são apostadas na relação, como nas máquinas de caça-níqueis, e o retorno obtido pode não compensar o esforço empreendido para obtê-lo.

Cuidado, portanto, com a carência! Avalie a relação por aquilo que ela pode te proporcionar e pelo esforço que vai empreender para conseguir se sentir realizado(a). E pense em algo importante: os relacionamentos afetivos não são as suas únicas fontes de reforçamento. Existem outras. Procure explorá-las para não se tornar refém da carência.


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