sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Reflexões Sobre o Tempo e o Controle de Estímulos

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Não quero entrar nos detalhes epistemológicos envolvidos na definição da categoria "tempo". Deixo esta tarefa para os filósofos da ciência. Minha pretensão é mais modesta. Concordando com Caetano Veloso, eternizado na doce voz de Maria Gadu, aceito poeticamente que o tempo é o "tambor de todos os ritmos". Isso quer dizer que eu aceito que todos aqueles aspectos relacionados ao tempo exercem sobre o comportamento de descrevê-lo ou quantificá-lo um controle discriminativo, e que esse controle vai se alterando na medida em que nossos repertórios comportamentais vão sendo modificados pela ação imperiosa das contingências de reforçamento, ou para ser mais poético, que nossas experiências vão se alargando a partir de nossas vivências concretas ditadas pelos ritmos dos tambores do tempo.

Disso resulta uma conclusão imediata: a forma de "percebermos" a passagem do tempo modifica-se na medida em que mudamos a nossa forma de relacionarmos com o mundo. Basta uma pequena observação para constatar tal façanha, que não é obra do tempo e nem do acaso, e sim das contingências de reforçamento. Pare e pense: como é para mim a passagem do tempo? Depois de responder a essa questão, tente responder a uma outra: eu tenho a impressão de que o tempo tem passado cada vez mais rápido? Uma última: as coisas sempre foram assim, ou seja, sempre tive essa impressão de que o tempo é um senhor severo que passa tão rápido sem que eu tenha algum controle sobre ele?

As coisas nem sempre foram assim... Na medida em que envelhecemos, e eis aí a ação imperiosa do tempo e das contingências filogenéticas, nosso comportamento de contar a passagem do tempo produz a impressão de que ele passa tão rápido que não é possível frear a sua ação sobre nossos corpos. Surgem as rugas, mas com elas a experiência. Mas, também com elas é alterado o controle discriminativo do comportamento de contar a passagem do tempo. O controle discriminativo é alterado porque mudam as referências que servem como parâmetros para se fazer a contagem do tempo.

Retrocedamos um pouco na infância para entender como é modelado o comportamento de fazer a contagem do tempo. Para as crianças o brincar e os brinquedos são os reforços mais importantes, e toda contagem de tempo se faz quase que exclusivamente em função destes reforços. Quanto éramos crianças ficávamos a espera da hora de brincar e dos momentos em que recebíamos os nossos reforços mais importantes: os brinquedos. Geralmente isso acontecia em três oportunidades: aniversários, dia das crianças e natal.

O tempo parecia demorar a passar, pois os marcadores de tempo eram eventos que ocorriam anualmente. Talvez vocês estejam questionando que minha análise seja um tanto etnocêntrica, que ela não se aplicaria a crianças oriundas de classes menos favorecidas e que não tiveram a oportunidade de fazer uma contagem de tempo baseada no recebimento dos reforços brinquedos. Vocês estão certo! Estas crianças certamente tem uma parâmetro de contagem de tempo completamente distinto. Muito cedo começam a vender balas nos faróis das grandes cidades, e precisam aprender a contar o tempo de forma mais acurada, pois ele pode ser um aliado ou um inimigo na obtenção da sobrevivência. Para elas o sol não pode se esconder no poente sem que tenham produzido o necessário para a própria sobrevivência e para a sobrevivência da família. Acredito até que este é um excelente objeto de estudos: a contagem do tempo em crianças submetidas à lógica perversa do capital...

Depois de um tempo, mais precisamente quando entramos no universo escolar, mudam-se os parâmetros da contagem de tempo. A criança aprende que todos os dias num determinado horário ela deve tomar banho, fazer a refeição e se aprontar para ir para a escola. Ela aprende que alguns dias da semana ela vai para a escola e que em outros ela fica em casa com os pais. Começa, então, a aprender a diferença entre dia e noite, que o nascer do sol significa um novo dia que se inicia, e que o cair da noite sinaliza discriminativamente o fim de mais uma jornada diária. Começa a se estabelecer o controle discriminativo para a contagem do tempo em termos de dias e semanas. Levará algum tempo para aprender a fazer a contagem do tempo em termos de horas, dias, semanas e meses.

No entanto, haverá uma ocasião em que a criança será submetida ao controle do relógio, ou seja, ela aprenderá que os ponteiros num determinado local é sinal de uma determinada hora do dia. Com isso ela aprende que o dia se divide em algumas partes: manhã, tarde e noite. Ela aprende que existe 8:00 da manhã e 8:00 da noite, que existe 5:00 da manhã e 5:00 da tarde. A partir, de então, o tempo começa a ser contado em termos de horas. Se antes ele era contado anualmente a espera da data do aniversário, agora passa a ser contado de hora em hora.

Com isso a criança aprende a discriminar que em determinadas horas do dia ela deve se entregar a algumas tarefas. Deve tomar banho para ir para a escola, deve sentar-se à mesa para fazer a refeição, deve realizar as tarefas escolares, deve cuidar de outros afazeres etc. Assim ela aprende que determinadas atividades devem ser feitas num determinado momento do dia. A partir daí ela conta o tempo em função destas atividades e a partir do posicionamento dos ponteiros do relógio. Ela aprende também que se as atividades forem realizadas no momento correto do dia, receberá por isso um reconhecimento, e se não forem, talvez seja punida de alguma forma. Dessa maneira, o tempo se torna um parâmetro para recebimento de reforços positivos ou para a esquiva de punições.

Mais tarde na vida adulta, esse controle discriminativo da contagem de tempo será essencial para a esquiva do controle coercitivo ou para o recebimento de benefícios. Outras variáveis envolverão a contagem do tempo na vida adulta. E ressaltamos aqui as variáveis econômicas. Dia do pagamento do boleto do cartão, da mensalidade do colégio dos filhos, do recebimento do salário etc. Hora de ir para o trabalho, hora de almoçar, hora de levar e buscar as crianças na escola, hora de sair do trabalho, hora de descansar etc. Há tantas atividades a serem feitas e uma boa contagem do tempo é essencial para o sucesso em todas elas, que passamos a viver em função destas atividades e do tempo correto para realização de cada uma delas. Assim, se faz necessária uma contagem acurada da passagem do tempo. Daí surge a impressão de que o tempo passa muito rápido!

Em outras palavras, quanto mais acurada é a contagem do tempo, maior será a impressão de que ele passa rápido. Se alguém não sabe contar o tempo, pouca probabilidade tem de perceber que ele está passando, a não ser pelo sinais inevitáveis do envelhecimento do corpo.Sendo assim, não há um controle natural do tempo sobre os nossos comportamentos. Contar o tempo é um comportamento que se aprende, e quanto melhor é a discriminação de contingências que envolvem essa contagem, mais o tempo se torna importante. Em alguns casos, talvez na maior parte deles, ele exerce um controle discriminativo sobre muitos de nossos comportamentos, em outros ele é um reforçador importante. Fato importante é que saber contar bem o tempo é essencial para relacionarmos com o mundo de forma mais efetiva, principalmente numa sociedade em que os atrasos são consequenciados com punição.

Para terminar, deixo vocês com Maria Gadu:



Leia mais...