sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Ciência ou publicidade?: o que realmente se faz nos bastidores acadêmicos

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Por vezes fico pensando se o discurso científico, que deveria ser um discurso que nos permite compreender e manipular com maior destreza certas parcelas da realidade, não está mais próximo do discurso midiático do que do discurso em que variáveis dependentes e indenpedentes estão de tal modo relacionadas, que seria possível prever com certo grau de exatidão o comportamento dos fenômenos estudados.  Essa é a função da ciência, ou seja, de produzir um saber que seja útil, um saber que torne mais fácil a vida do Homem, um saber que potencialize as chances da espécie humana continuar habitando a superfície do planeta.

Sendo assim, a ciência é pragmática em sua essência. O saber que ela produz não é apenas estético, ou seja, não é apenas algo para ser contemplado como um quadro que na parede torna o ambiente mais aprazível. Essa é a função das artes, de tornar mais aprazível a vida humana. Não necessariamente as artes têm por função gerar ferramentas que ajudem-nos a resolver problemas ordinários da vida cotidiana. Já a ciência deve e pode gerar meios através dos quais podemos nos livrar dos nossos problemas ou ao menos minimizá-los.

A ciência não é um quadro na parede para ser admirado! Não é um perfume que acalenta as narinas dos amantes. Mas ela pode ajudar a desenvolver técnicas que levem à produção de tintas e pincéis que tornem o pintar mais efetivo. Na idade média os pintores produziam suas próprias tintas, e muitas vezes elas eram tóxicas, pois continham grandes quantidades de chumbo e outro elementos nocivos à saúde. Este problema foi contornado com o desenvolvimento da química, que estudando a forma como os elementos se agrupam pôde produzir tintas com cores mais vívidas e que não agridem a saúde. Da mesma forma a ciência pode e tem ajudado no desenvolvimento de perfumes com maior poder de sedução. Ainda assim, a essência da ciência não é a estética.

A ciência se destaca por sua utilidade, por seu pragmatismo, por sua capacidade de produzir um saber que permite-nos intervir na realidade e transformá-la de tal modo que a vida humana acaba se tornando ergonomicamente mais adaptada aos espaços ocupados pelo Homem. Os espaços se adaptam ao Homem, como o Homem também se adapta aos espaços. Se compararmos um veículo produzido agora com um veículo produzido há três décadas atrás, os veículos produzidos no presente são muito mais seguros. Bancos se ajustam à coluna, volantes têm o tamanho ideal para que os músculos dos braços não sejam forçados, os cintos de segurança são mais eficientes, os motores e escapamentos produzem menos ruído e poluição, etc.

Os exemplos acimam atestam a essência pragmática do saber científico, mas tal essência parece incomodar muita gente. Basta dizer que a ciência é pragmática que os nervos de muitos se afloram, e isso ocorre principalmente nos bastidores das ciências sociais e humanas. Defender a pragmaticidade da ciência é tomado como uma defesa dos ideais norte-americanos. Então, circula com muita liberdade nos bastidores acadêmicos um anti-americanismo improdutivo, para não dizer tolo.

Associado ao anti-americanismo está a ideia de que tudo que vem da américa do norte é positivista e desumano. Se o que vem da américa do norte é positivista, então deve ser descartado, pois o positivismo equipara o fazer científico à produção de dados quantificáveis. Qual é o problema com a quantificação? O que é numérico não pode ser científico? Muito me admira ver cientistas sociais tendo aversão aos números. Não é de se espantar que o planejamento de políticas públicas no Brasil seja algo tão deficiente, pois números importantes sobre a realidade social são ignorados, ignorados por cientistas sociais que participam da elaboração destas políticas. Constroem políticas ao sabor da interpretação e não da constatação! A consequência disso é o desperdício de recursos públicos injetados nestas políticas, mas isso é assunto para outro post.

Tudo bem que a ciência não deva ser reduzida à quantificação. No entanto, ignorar a quantificação simplesmente porque ela pode representar um retorno ao positivismo é uma grande tolice! Ademais, os propagadores do anti-americanismo deveriam definir com maior exatidão o que entendem por positivismo, pois tal matriz filosófica tem diferentes matizes, algumas que entendem o fazer científico de modo bastante reducionista, outras nem tanto. Mas o discurso anti-americanista é de tal forma rebuscado que é convincente! Convence porque quem o escuta não o entende, o que é muito triste, pois dá a entender que produzir ciência é falar difícil.

Porque o discurso rebuscado é atraente, quem o ouve acaba reproduzindo-o. São papagaios que repetem sem saber porque estão repetindo. Então, a academia brasileira foi transformada num lugar para adestrar papagaios, e não num lugar para produzir cabeças pensantes que sejam capazes de questionar o discurso rebuscado e publicitário dos anti-americanistas. O que se faz nos bastidores da academia está mais próximo da publicidade do que da ciência. Basta ser capaz de construir um discurso edificado sobre palavras incompreensíveis que se é elevado à categoria de cientista.

Mas a questão que fica é a seguinte: os papagaios serão capazes de analisarem a realidade e construírem instrumentos para nela intervir e modificá-la, ou vão apenas reproduzirem o discurso incompreensível e rebuscado que aprenderam na academia? É o fazer que transforma o mundo e não a reprodução sem sentido de discursos incompreensíveis. Nunca é demais lembrar que as contingências de reforço do mercado de trabalho acabam selecionando quem é capaz de fazer e agir e não somente quem fala e é incapaz de colocar em prática um conhecimento que ao invés de ser pragmático é contemplado apenas em sua dimensão estética.

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