segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Saravá, mangalô três vezes: mandingas e fim de ano

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Fim de ano é sempre a mesma coisa. A mídia enche a cabeça das pessoas de bobagens. Com todo respeito a crença de cada um, não são um punhado de conchas atiradas sobre uma peneira decorada com colares e outros objetos que vão mudar o seu futuro. Mandinga nenhuma que existe sobre a terra pode alterar o seu futuro. O seu futuro depende de duas coisas: daquilo que você fez no passado e daquilo que anda fazendo no presente.

O que você fez no passado é tão importante quanto aquilo que anda fazendo no presente. O que fez no passado pode ter produzido as tendências comportamentais que você vem apresentando no presente. Então, não tente entender seu presente sem ao menos dar uma olhadinha para o seu passado. O Homem é um ser histórico, portanto, sua história faz dele o que ele é. O que você continua fazendo no presente pode tanto reforçar as tendências comportamentais modeladas no passado, quanto reverter estas tendências, ou pode ainda criar outras.

Sendo assim, olhar para o passado e para o presente é o primeiro passo que deve ser dado para gerar novas tendências comportamentais que se manifestarão no futuro. De certa forma todo mundo sabe disso. Todo mundo sabe que sem entender o passado somos privados de compreender o "porquê" de agirmos assim ou assado no presente, como também sabe que aquilo que se planeja no presente pode alterar os resultados das ações no futuro. Esse é um conhecimento que faz parte do senso comum.

Embora faça parte do senso comum, ninguém conhece os meios adequados de como se pode construir conhecimento sobre o passado, e, sobretudo, como este conhecimento pode ser aplicado para alterar o presente e planejar o futuro. É aí que entre a Ciência do Comportamento com todo o seu arsenal filosófico, teórico e tecnológico. O que a ciência do comportamento tem a nos oferecer é a possibilidade de entermos a nós mesmos, e este conhecimento deve ser o ponto de partida para qualquer tipo de planejamento que queiramos fazer a respeito de nossas vidas.

Inclusive, esta ciência pode nos oferecer a possibilidade de entender porque as pessoas se deixam seduzir por promessas de mandingas, simpatias, advinhações e outras práticas culturais que invadem a mídia nos fins de ano. Se invadem é porque rendem algum ibope, e isso é fato. Mas por que as pessoas são seduzidas tão facilmente a colocarem em prática ações que não têm o menor poder de alterar suas vidas? Que mecanismos de aprendizagem subsiste atrás destas práticas? Destaquemos alguns: imitação, reforçamento acidental, controle de estímulos e coerção.

Imitação. A imitação está na base da aprendizagem de muitos dos comportamentos que fazem parte de nosso repertório total de comportamentos. Desde tenra idade imitamos os adultos, e quando o comportamento imitativo se aproxima do comportamento imitado é seguido de reforços positivos. A aquisição da fala é um bom exemplo. O pai diz "papai". A criança repete "papá". O comportamento se aproximou do comportamento do pai, e por causa disso é reforçado. Com a repetição da cena logo a criança aprende a dizer papai. O mesmo mecanismo é válido para a aquisição de outras palavras e para a formulação de frases mais complexas.

Quem nunca viu uma criança calçando os calçados dos pais ou mesmo vestindo suas roupas? Esse comportamento de imitar os pais é a base para o comportamento de fazer no futuro aquilo que os pais fazem, inclusive é a base para seguir os seus conselhos. Quando não sabemos nos virar em certa situação geralmente imitamos quem sabe. Por exemplo, se um sujeito está em uma danceteria e não sabe dançar, ele arrisca alguns passinhos observando aquilo que as pessoas estão fazendo. Em seguida começa a fazer o mesmo, e se é bem sucedido possivelmente seu comportamento é reforçado.

Com os comportamentos de fazer simpatias, pular ondinhas, ler horóscopo, vestir roupa de determinada cor não é diferente. Se um sujeito como o apresentador Luciano Huck oferece flores para Iemanjá no programa de encerramento do ano, é possível que muitos dos seus fãs façam o mesmo. Os fãs seguem o apresentador na tentativa de obter aquilo que ele tem: carisma, fama, sucesso, dinheiro, etc. Lógico que as pessoas não têm consciência disso, mas acabam agindo por imitação. Podem não imitar exatamento o Huck. Todavia podem acabar imitando alguém mais próximo que disse que seu ano foi bem sucedido porque ofereceu flores para Iemanjá no ano anterior.

Reforçamento acidental. Reforçamento acidental pode acabar modelando comportamentos supersticiosos. Se o menino que ao jogar bolas de gude com os amigos faz "figa" com os dedos todas as vezes que realiza uma jogada, e se algumas das jogadas acabam sendo bem sucedidas, gera-se um comportamento de acreditar que a "figa" foi responsável pelo sucesso. Acidentalmente o comportamente de fazer "figa" foi reforçado. Com o horóscopo não é muito diferente. Ocasionalmente o que se lê no horóscopo dos jornais pode se confirmar na realidade. Mera coincidência. Todavia, o reforço acidental pode modelar a tendência de continuar baseando decisões na leitura do horóscopo. O problema do reforço ocasional é que o comportamento supersticioso é modelado em um esquema de reforçamento intermitente, e sabemos que esquemas de reforçamento intermitente geram comportamentos resistentes à extinção.

Controle de estímulos. O termo controle de estímulos faz referência ao fato de que o comportamento também é controlado pelos estímulos do contexto em que ocorre. Então o comportamento operante é controlado tanto por suas consequências quanto pelo contexto em que ocorre. Os estímulos do contexto aumentam a probabilidade de que o comportamento ocorra. O bombardeamento midiático cria contextos que elevam as chances das pessoas se renderem às mandingas e simpatias, principalmente se estes comportamentos já fizerem parte de seus repertórios. Os programas de TV mostram pessoas que obtiveram sucesso porque consultaram a numerologia, os búzios, as cartas, etc. Mandingas e simpatias são associadas a reforçamento positivo, e isso pode criar ocasiões propícias para que sejam modelados comportamentos supersticiosos.

Coerção. Coerção é uso de punição ou a ameaça de uso de punição. O futuro é sempre algo inigmático, e a ele estão associadas as possibilidades de catástrofes e eventos inesperados. Catástrofes e eventos inesperados são estímulos bastante coercitivos. Se tais estímulos puderem ser minimizados de alguma forma, possivelmente as pessoas se entregarão às práticas que podem minimizá-los, que podem evitá-los ou diminuir seu raio de ação. Jogar búzios, cartas, ler o horóscopo, etc, são tentativas de diminuir a imprevisibilidade do futuro, tornando-o, assim, menos aversivo. Tudo que as pessoas querem acreditar quando se inicia um novo ano é que ele será menos aversivo do que o ano que passou, por isso muitas se entregam a estas práticas já citadas.

As quatro situações citadas podem ajudar-nos a entender os motivos que estão por trás de comportamentos supersticiosos. Mas o futuro não pode ser alterado com mandingas, simpatias ou qualquer outro tipo de prática oculta. Isso não quer dizer que ele não possa ser modificado. Sim, ele pode, desde que haja planejamento. Mas nenhum planejamento terá a chance de obter sucesso se não estiver ancorado em informações críveis sobre o passado e também sobre o presente. É em nossa história que encontramos a oportunidade de conhecer as variáveis que controlam o nosso comportar-se, e é alterando estas variáveis  que modificamos a nossa forma de agir. Qualquer promessa fora destas possibilidades é pura fantasia! Aproveitando a oportunidade, desejo a todos os leitores um feliz 2013!

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quarta-feira, 14 de novembro de 2012

O Amor e os Seus Mitos

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Novamente o amor é tema do blog Café com Ciência. O poder do amor, ou melhor dizendo, o poder que o comportamento de amar tem de produzir contextos (estímulos discriminativos) e de gerar estímulos reforçadores que respectivamente produzem disposições para agir de determinada forma, como também reforçam tais disposições, é o motivo pelo qual este sentimento, ou esta forma de se comportar ter sido tão retratada ao longo da história da humanidade em pinturas, poemas, histórias, novelas etc.

O amor exerce um grande fascínio sobre aqueles que amam. E o motivo não é muito difícil de entender. Quem ama se mobiliza para fazer com que o amor se transforme no tema central de sua vida. Se mobiliza porque o amor tem o poder de gerar estímulos reforçadores os mais diversos, inclusive e principalmente estímulos de natureza sexual. Não me refiro ao sexo propriamente dito. Um beijo, é por exemplo, um reforço de natureza sexual, pois deriva seu poder de reforçar da sua capacidade de estimular sensorialmente os lábios, e tal estimulação naturalmente vai provocar (eliciar) comportamentos reflexos (mudanças fisiológicas) descritas como prazer.

Logicamente que o poder do beijo de reforçar não advém apenas da seleção natural, da filogênese. Ele depende também da cultura. Em nossa cultura o beijo é uma espécie de rito de iniciação à vida sexual. Está associado à conquista e ao cortejo. Culturalmente o beijo é uma espécie de objeto de desejo, primeiro passo que sucede a tantos outros que podem levar a obtenção de prazer sexual. Filmes e novelas transformam o beijo em uma grande encenação teatral, e sendo dramatizado de tal forma passa a ser objeto de desejo das massas. Então, as contingências culturais também têm um papel na determinação do poder reforçador de um beijo ou mesmo de qualquer outro gesto de carinho.

Beijos e gestos de carinho são comportamentos através do qual o amor é expressado. Tais comportamentos geram disposições comportamentais no(a) parceiro(a), como também podem reforçar estas disposições. Dito isso, entedemos porque o amor exerce um fascínio tão grande sobre aqueles que amam, ou seja, isso acontece por causa do poder que o amor tem de produzir reforços, reforços que modelam os mais diversos tipos de comportamentos, reforços que derivam sua força da seleção natural e de contingências culturais. Em função disso muito já se disse sobre o amor ao longo da história, aliás, por causa disso muito ainda se diz a respeito do amor. Mas muito do que se diz sobre o amor são mitos e lendas. Gostaria de enumerar pelo menos dois destes mitos, e farei isso através de alguns questionamentos.

Só se ama uma vez? Quem leu o post "Uma Análise Comportamental da Dor de Amor" sabe que essa pergunta não pode ter um "sim" como resposta. O motivo é simples. Emoção é comportamento. O amor é uma emoção, logo é comportamento. Como comportamento ele está sujeito aos efeitos das consequências que produz, quanto do contexto em que ocorre. Em outros dizeres, o comportamento de amar está sujeito a ação das contingências de reforço, como também das contingências da seleção natural e das contingências culturais como já assinalado. Sendo assim, alguém pode deixar de amar uma pessoa, mas isso não quer dizer que ela perca a capacidade de amar, ou seja, isso não quer dizer que ela não pode voltar a amar uma outra vez.

Essa conversa de que só se ama uma vez é mito. Quando um relacionamento termina, quando um amor se acaba, os comportamentos de amar o(a) parceiro(a) entram em extinção. Expliquei esse processo com detalhes no texto "Uma Análise Comportamental da Dor de Amor", texto ao qual já fiz referência. Aconselho que leitor dê uma olhadinha neste texto. O que ocorre, então, é que se deixa de amar o(a) parceiro(a), ou seja, os comportamentos de amar direcionados aquela pessoa entram em extinção. Isso não quer dizer que o repertório total dos comportamentos que compõem a classe de comportamentos de amar sofra uma completa extinção.

A fila anda, e em nova ocasião pode aparecer um parceiro diferente que ofereça reforçadores bastante distintos, e isso é suficiente para que o comportamento de amar esse novo parceiro seja modelado e passe a fazer parte do repertório de comportamentos de amar. O que pode ocorrer é que a pessoa traga marcas do relacionamento anterior que interfiram no novo relacionamento. Em outras palavras, ela pode trazer disposições comportamentais modeladas por outros relacionamentos, e estas disposições acabam ocasionando problemas para o novo relacionamento. Mas isso não ocorre porque a pessoa perdeu sua capacidade de amar, mas sim por causa de eventos que no passado geraram disposições comportamentais com potencial para produzir problemas os mais diversos quando novos relacionamentos são estabelecidos. Sendo assim, consideremos derrubado o primeiro mito a respeito do amor: "só se ama uma vez".

Depois que deixamos de amar uma pessoa, podemos voltar a amá-la? Sim, nós podemos, embora, essa não seja uma tarefa muito fácil, porque quando se deixa de amar geralmente se cria aversão. Aquele que era objeto de amor muitas vezes acaba se transformando em objeto de outros sentimentos como a raiva, ou seja, aquele que era uma potencial fonte de reforços se transforma em uma fonte de estímulos aversivos, provocando repulsa (comportamento de fuga/esquiva). Nem sempre esse é o caso, mas muitas vezes acontece, principalmente quando o relacionamento termina de forma traumática.

Podemos voltar a amar alguém que se deixou de amar, bastando para isso identificar no relacionamento fontes de reforçamento que não foram exploradas. Estas novas fontes de reforçamento podem criar contextos que voltem a suscitar o comportamento de amar, de modo que este comportamento tenha a oportunidade de ser novamente reforçado. Com isso novas interações são criadas entre o casal, e estas novas interações produzem novos reforços. Por sua vez os novos reforços vão fortalecer o laço de amor entre o casal, ou seja, vão fortalecer as disposições de demonstrar amor entre os parceiros.  Fica derrubado, portanto, o segundo mito.

Poderia aqui explorar tantos outros mitos, mas estes dois nos dão uma dimensão do quão complexos são os comportamentos que envolvem as expressões de amor. Mas importante é saber que o amor é comportamento, e que comportamento pode ser modelado. Se pode ser modelado, relações podem ser refeitas. Importante é saber que as respostas para o amor e suas frustrações estão nas contingências de reforço. Uma vez analisadas as contingências podem nos revelar muito sobre os nossos sentimentos, inclusive sobre o amor.

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quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Uma Análise Comportamental da Dor de Amor

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Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Ahhhh, o amor... Nobre sentimento que inspirou pelos séculos os poetas e artistas. Quantas pinturas não foram feitas para expressar um amor? Quantos poemas não foram escritos por amor? Queria muito nesta postagem tratar deste tema sem recorrer à ciência, pois a ciência parece fria, distante, e aparentemente o que ela teria a dizer sobre o amor? Bem, ela tem muita coisa, principalmente a ciência do comportamento, ciência que tem o Behaviorismo Radical como seu fundamento filosófico.

O amor tem um grande poder. Como estímulo reforçador ele pode modelar os mais diferentes comportamentos. Uma pessoa apaixonada escreve cartas de amor, manda ao longo do dia mensagens de sms para expressar o seu querer, posta no facebook imagens e mensagens para tornar público sua alegria de amar. Ahhh, eu não poderia deixar de citar os "sms's" e o "facebook", pois em pleno século XXI o amor encontra nestes meios as suas formas de expressão... Rs!!! É a modernidade atualizando os meios para se expressar o amor.

Amor é comportamento! Sim, é comportamento. Sei que parece esquisito, mas amor é comportamento emocional sujeito a ação das consequências que produz. Um(a) amante expressa seu amor pela(o) amada(o) através do facebook, orkut (morto ou não?! Rs...), twitter, youtube etc, porque desta forma obtém a atenção e as carícias da(o) parceira(o). Vejam, então, o condicionamento operante de fato operando... O comportamento opera no ambiente modificando-o e é ao mesmo tempo modificado, ou seja, o amado que manifesta seu amor modifica o ambiente ao aumentar a probabilidade de que a amada responda satisfatoriamente com carícias e juras de amor.

O amado faz isso com seus próprios comportamentos, como os já citados: postando no facebook, usando sms, etc. Estes comportamentos geram estímulos que aumentam a probabilidade da amada agir de forma a reforçar o que o amado faz e vice-versa. Assim o amor enquanto comportamento vai sendo fortalecido, de modo que sua frequência de emissão vai aumentando. Mas, como "nem tudo são flores", o amor também enfrenta problemas, e isso os poetas sabem muito bem, tanto que Camões assim descreveu este nobre sentimento (compotamento): "Amor é fogo que arde sem se ver; / É ferida que dói e não se sente; / É dor que desatina sem doer."

O amor "é dor que desatina sem doer". Quem já amou e perdeu um amor sabe o que é isso! A dor da perda de um amor costuma se manifestar por comportamentos respondentes bastante distintos: ansiedade com aquela pontada no coração, o que faz parecer que o coração é o reduto do amor; estômago nauseado; rigidez muscular, etc. Quando se ama alguns comportamentos reflexos ficam sob o controle dos estímulos gerados pelo comportamento da pessoa que se ama. Ao se perder quem se ama, perde-se algo importante, o que produz controle aversivo, ou seja, quem perde um amor diz que a perda dói, e isso acontece porque a perda produz punição (controle aversivo). Punição produz todos estes estados emocionais colaterais, que são na verdade exemplos de comportamentos reflexos.

Mas a perda de um amor também é ocasião para a emissão de muitos comportamentos operantes. Quem já perdeu um amor, provavelmente nos primeiros dias e semanas sentiu a todo instante uma vontade de estar com a(o) amada(o), ouviu músicas que lembravam o amor perdido, ensaiou pegar o telefone várias vezes para ouvir a voz daquele(a) que era a fonte de todo o amor, chorou, falou da pessoa perdida para todo mundo, etc. Essa é uma experiência universal para o fim de todos os amores.

É universal porque o que ocorre quando se perde um amor é que todos os comportamentos que antes eram dirigidos à pessoa amada começam a entrar em extinção. Todo comportamento quando emitido e não reforçado entra em extinção, ou seja, começa a perder sua força até voltar ao que era antes de ser modelado, de ser fortalecido pelos diversos reforços que o seguiram. Mas no início do processo de extinção os comportamentos ao invés de declinarem aumentam de frequência. Por isso no início da perda de um amor se pensa tanto em quem se perdeu, se ensaia ligar para o(a) amado(a) que se foi, são ouvidas músicas que lembram os velhos tempos, etc.

Todavia, a cada ocorrência destes comportamentos, se eles não são reforçados, acabam se enfraquecendo, até desaparecerem. Então, caro leitor, não se assuste se no início da perda de um amor você se ocupa apenas do amor perdido. Não se preocupe, pois cada vez que se engajar nestes comportamentos e eles não forem reforçados, inevitavelmente entrarão em extinção. Ou seja, a dor acaba passando. Lógico que ela passa mais fácil se você se engajar em outros comportamentos que sejam capazes de produzirem reforços que substituam aqueles que eram gerados pelos comportamentos da pessoa amada.

Não necessariamente você precisa entrar numa nova relação imediatamente, pois isso nem sempre ajuda. Quando falo de reforços que possam substituir àqueles gerados pelo amor que foi perdido, me refiro aos reforços que podem surgirem como consequências de você se expor a novas contingências de reforço, contingências que podem ser experimentadas em atividades como lazer, uma boa leitura, um bom filme, um papo com os amigos, uma atividade esportiva, etc. Se expor a novas contingências é o melhor remédio! Tente e depois me diga.

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segunda-feira, 3 de setembro de 2012

O Feudalismo Político Brasileiro

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

A democracia nunca foi um traço marcante da cultura brasileira desde os primóridos da formação de nossa nação, ou seja, a possibilidade do exercício do contracontrole é algo bastante recente na história de nosso país, algo conseguido no início dos anos 90. O que em tese a democracia tem a nos oferecer é a possibilidade de participarmos da gestão pública, ou seja, de exercermos controle sobre aqueles que governam, e isso ocorre através dos mecanismos oficiais que existem para esse fim, e em democracias representativas como a brasileira o voto é o maior de todos estes mecanismos.

O voto não deveria ser e nem é o único meio através do qual a população pode exercer controle sobre quem governa. Cada política pública cria espaços em que a participação na gestão se torna algo possível. Na Assistência Social, por exemplo, existem os conselhos municipais de assistência social, que seguem o modelo da política de saúde onde existem os conselhos de saúde. Através destes conselhos a população pode acompanhar a gestão das políticas, como também propor medidas para que elas atinjam de fato o público ao qual estão destinadas. Em outras palavras, estes conselhos tornam possível o exercício do contracontrole, uma contingência possível em governos democráticos.

Todavia, na prática tais conselhos encontram inúmeras dificuldades para funcionarem, que vão desde o despreparo de quem deles participa, despreparo que se faz notar pelo desconhecimento da política sobre qual o conselho deve exercer contracontrole, até o cerceamento de informações que dificultam o funcionamento destes que deveriam ser espaços privilegiados onde a democracia participativa tem possibilidade de ser fomentada. Este cerceamento se traduz pelo fornecimento de informações incompletas aos conselhos pelos órgãos públicos. Quando estas informações são completas chegam aos conselhos com tanto atraso que a discussão sobre as mesmas ficam prejudicadas, e por causa disso muitas deliberações são tomadas sob pressão.

Mas os conselhos também costumam serem utilizados pelos membros que deles fazem parte para inviabilizar iniciativas que poderiam produzir benefícios sociais em larga escala, e agem assim porque utilizam o conselho em benefício próprio, seja para conseguirem visibilidade social que pode se traduzir em votos numa possível eleição futura ou em cargos na administração pública. Isso faz com que o fim para qual foi criado o conselho seja completamente desvirtuado, ou seja, ao invés de criarem contingências para o exercício de um efetivo contracontrole, se transformam em meios para obtenção de benefícios pessoais ou em vitrines para oposições políticas que muitas vezes mais inviabilizam do que promovem a efetividade de iniciativas tomadas pela administração pública.

Os conselhos acabam se transformando em feudos, e alguns membros que deles participam agem como vassalos que ora trocam seu trabalho por proteção e um lugar ao sol e ora tentam usurpar o poder do senhor feudal. Estas relações de vassalagem que transformam conselhos e órgãos públicos em feudos, acabam por criar contingências em que poucos são beneficiados. É a utilização da administração pública para obtenção de benefícios pessoais. Quem perde com isso é toda a sociedade, pois enquanto se gasta tempo utilizando órgãos públicos para obtenção de benefícios sociais, acaba-se desperdiçando recursos públicos que poderiam ser investidos em serviços de qualidade.

Com tudo isso o voto enquanto meio para exercício de contracontrole acaba sendo excessivamente valorizado, a ponto de muitos pensarem que ele é o único recurso que a sociedade dispõe para influenciar a conduta de seus governantes. Dada a importância que se atribui ao voto, tudo se faz para poder conquistá-lo. Milhões são investidos em campanhas que fazem o uso dos recursos do marketing e propaganda para que eleitores sejam convencidos, e geralmente eles são. Logicamente que aqueles que financiam tais propagandas mais tarde cobram os seus favores. A estes são reservados cargos na administração pública ou são promovidas ações que os beneficiem.

Todas estas ações são uma forma de garantir que o feudo será conquistado e mantido durante quatro anos, e assim a festa da democracia vai fortalecendo os laços de vassalagem entre administração pública e privada, bem como os laços entre coligações que se formam com o objetivo de se apoderarem do castelo do grande senhor, e aqui o castelo é o prédio da prefeitura com todas as suas repartições. Os secretários escolhidos a partir de alianças forjadas entre partidos que se declaravam como opositores, são os senhores feudais submetidos à autoridade do grande rei, e aqui fica difícil definir se o rei é encarnado na figura do prefeito ou daqueles que financiam sua gestão.

Ficam para escanteio os critérios técnicos. Valorizam-se as alianças, por assim dizer os critérios politicos, o que acaba inviabilizando uma gestão mais técnica das políticas públicas, pois uma gestão técnica pode enfraquecer os laços de vassalagem e levar à dissolução do feudo. Então, muitas são as contingências por trás da democracia brasileira. Nossa democracia não é formada apenas pela contingência criada pelo voto. Há muitos reforços que vão além do voto e estes precisam ser considerados se quisermos apreender toda a riqueza de detalhes que compõem o quadro político brasileiro, pois estes reforços controlam os comportamentos dos gestores de políticas públicas, e por sua vez os comportamentos dos gestores criam contingências que afetam toda a coletividade.

Fica claro, portanto, que a democracia "pura", aquela em que há espaços para participação popular ainda não existe totalmente em nossa cultura, pois tais espaços estão submetidos ao interesse da iniciativa privada ou estão sob a tutela de quem usa a administração pública para a produção de benefícios individuais. Não se trata de uma análise pessimista, e esta nem pode ser generalizada a toda administração pública em qualquer um de seus níveis. Mas via de regra, encontraremos circunstâncias muito parecidas com as que foram esboçadas neste texto em muitos recantos deste nosso imenso país.

Nossa democracia precisa ser aprimorada se não quisermos estar constantemente sobre a ditadura burra da maioria que é facilmente manipulada por quem está no poder, e estes usam os mais diferentes recursos para conseguirem tal intento. Temos algumas alternativas para reversão deste quadro: o privilégio de critérios técnicos, critérios que sejam capazes de provar que este ou aquele curso de ação tem maior capacidade de produzir resultados; e eliminação daquelas contingências que interferem com o pleno exercício do contracontrole e que foram acima descritas.

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sábado, 25 de agosto de 2012

"Eu me amo, eu me amo, não posso mais viver sem mim": narcisismo, ciberespaço e capitalismo

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Caetano Veloso em tom poético cantou que "Narciso acha feio tudo que não é espelho". O Mito de Narciso é uma história que nos remete à mitologia grega, uma história que fala sobre um jovem que ao se deparar com sua imagem na  lâmina d'água de um lago apaixona-se por si mesmo. O mito é utilizado para fazer referência ao apego que muitas pessoas têm a si mesmas. Estas pessoas são geralmente chamadas de narcisistas ou até mesmo de egocêntricas.

Narcisismo e egocentrismo, dois termos de grande difusão social. Esta difusão se deve à Psicanálise, que se apropriando do mito de Narciso utilizou-o para explicar a dificuldade que muitas pessoas têm para adiarem suas satisfações, sendo portanto guiadas por um sentimento de urgência. Desta apropriação surgiu o termo narcisismo, que de acordo com a Psicanálise trata-se de uma fixação que ocorre nos primeiros estágios do desenvolvimento humano.

Ainda de acordo com a Psicanálise, nos primeiros estágios do desenvolvimento somos guiados pela urgência em satisfazer nossas necessidades. A criança chora e a mãe dá-lhe o peito. A criança resmunga e a mãe a livra do incômodo das fraldas. A satisfação quase sempre é imediata. Disto podem resultarem registros mentais que levam a busca de satisfação imediata, e no futuro a pessoa pode se tornar um adulto que toma a si mesmo como a medida de todas as coisas, ou seja, que coloca o seu "eu" (ego) como centro do universo.

Ego é outro termo psicanalítico. Quase um sinônimo de "eu" o ego seria a estrutura mental responsável por negociar com o Id (inconsciente) quando as satisfações de nossos desejos ocorrerão. Se por um lado o ego é regido pelo princípio de realidade, é dominado pela razão, por outro lado o id é regido pelo princípio do prazer, buscando a todo instante a satisfação de desejos reprimidos. Um ego frágil vai ceder aos impulsos do id, tendo, portanto, dificuldades em adiar a satisfação dos desejos e de lidar com frustrações. Deriva desta dificuldade o egocentrismo. Daí nota-se a aproximação entre os conceitos de narcisismo e egocentrismo.

Deixando de lado toda a mitologia psicanalítica, pois a explicação psicanalítica é tão mítica quanto a mitologia grega, fiquemos apenas com aquilo que se descreve como sendo narcisismo: dificuldades em adiar a satisfação e colocar-se como centro do universo. Há que se esclarecer as contingências de reforço que podem ser responsáveis pelos comportamentos agrupados sob o rótulo de narcisismo, para em seguida compreendermos como o modo de produção capitalista e também o mundo do ciberespaço têm modelado pessoas com dificuldades em adiarem suas satisfações, pessoas que colocam a busca do prazer como o centro de suas vidas.

A dificuldade em lidar com frustrações, em adiar o prazer e buscá-lo incenssantemente a ponto de sacrificar aspectos importantes da vida, como, por exemplo, a vida social, tem a ver com o modo como em nossa história as consequências foram seguindo nossos comportamentos e nos tornando predispostos a intolerância, ou seja, nos tornando sensíveis ao adiamento de nossas satisfações, de modo que diante de frustrações agimos quase sempre com ataques emocionais.

Esta sensibilidade ou propensão à intolerância quase sempre é produto de esquemas de reforçamento contínuo. Neste tipo de esquema o reforço segue o comportamento praticamente todas as vezes que ele é emitido. Este tipo de esquema costuma estar presente em histórias de pessoas "mimadas", de pessoas que tiveram que se esforçar muito pouco para obterem a satisfação de suas necessidades e desejos, pois os pais ou outros membros da família quase sempre proviam estas satisfações ao menor sinal de alteração emocional.

É sabido que quanto mais imediato um reforço ocorre depois de  um comportamento, maior a chance deste comportamento ser fortalecido. Então, há uma relação entre a imediaticidade da consequência e a força do comportamento. Pessoas que tiveram satisfações imediatas proporcionadas pelo meio familiar, e se estas satisfações eram imediatas às queixas, às manifestações de insatisfação, acabam se tornando intolerantes às frutrações, ou seja, se tornam incapazes de adiarem os seus prazeres, agindo quase sempre por um senso de imediatismo. Portanto, a intolerância como padrão comportamental pode ter relação com o esquema de reforçamento e com a imediaticidade com a qual os reforços foram apresentandos ao longo da história de modelagem de certos comportamentos.

Sendo assim, pessoas podem se tornarem reféns das contingências de reforço, ou seja, da forma como os reforços são apresentados, se tornando imediatistas e incapazes de adiarem a satisfação de seus desejos e necessidades. São modeladas não somente para serem intolerantes às frustrações, como também para buscarem a satisfação imediata. Estas pessoas se tornam presas fáceis do ciberespaço, espaço em que a satisfação pode ser obtida apenas com um clique. A satifação não obtida na realidade pode ser alcançada através do ciberespaço.

No ciberespaço tudo parece ser mais fácil. As amizades são virtuais, sendo assim, os aborrecimentos podem ser evitados bloqueando ou excluindo alguém da rede de contatos. O prazer pode ser buscado em chats e redes sociais. Até mesmo pode se obter reforços sexuais por meio do ciberespaço. Há inúmeros chats que oferecem sexo virtual por meio do uso de uma webcam. Com uma webcam e um computador com acesso a internet pode se ampliar as possibilidades de obtenção de reforços.

Talvez seja hora para parar e pensar os efeitos da cultura digital sobre o comportamento das pessoas. Essa cultura não criaria circunstâncias favoráveis para a modelagem de comportamentos narcisistas? Essa cultura não favorece o fechamento sobre si mesmo de modo que as pessoas passem a entenderem que se bastam a si mesmas? Essa cultura não acaba por favorecer o individualismo? Quais são os efeitos da obtenção tão facilitada de reforços com apenas um clique?

Se na vida real os reforços podem ser adiados por causa de uma série de circunstâncias, no ciberespaço eles são facilmente obtidos. Mas que tipos de comportamentos estes reforços estão reforçando? Comportamentos de não fazer nada, ou de se empenhar em atividades que concorrem com outras mais produtivas. Não por acaso muitas empresas bloqueiam o acesso a chats e redes sociais, pois o comportamento de navegar em tais redes e chats concorre com o comportamento de trabalhar, o que afeta a produtividade e acarreta prejuízos. 

Seria exagero conjecutar se o mundo digital não estaria contribuindo para a criação de uma cultura do imediatismo? Creio que não. E talvez ele esteja apenas fortalecendo contingências que já operavam no mundo antes de sua existência, contingências que fazem parte de um mundo capitalista "em que tempo é dinheiro", um mundo do "just in time", um mundo regido pela urgência em produzir, pois existe de outra parte a urgência em consumir, um mundo regido pela produção versus consumo.

Se é preciso produzir com urgência, pois existe a necessidade urgente de se consumir o que se produz, cria-se um círculo vicioso em que o consumo é sinônimo de satisfação que não pode ser adiada, em que o consumo é realizado sem que se pense nas consequências, sem que haja consciência das contingências que o determinam. Desta forma o consumo é realizado sem se questionar sobre o que está sendo consumido, pois o que importa é consumir, o que importa é obter prazer.

O produto deste ciclo entorpecedor é a construção de pessoas cada vez menos conscientes dos determinantes de seus comportamentos, ou seja, pessoas que são incapazes de assumirem um posicionamento crítico com relação ao seu modo de vida e sobre o mundo em que vivem, pessoas inseridas numa teia de consumo em que elas mesmas são um produto a venda em stands reais e virtuais. O não pensar nas consequências produz pessoas alienadas, pessoas enamoradas pelo seu prazer como Narciso por sua imagem refletida no espelho d'água, pessoas que podem ser descritas com o refrão da música do Ultraje a Rigor: "eu me amo, eu me amo, não posso mais viver sem mim".


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sábado, 18 de agosto de 2012

Relação Terapêutica e Calor Humano

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Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Muitas visões deturpadas orbitam em torno do tema psicoterapia, seja porque não existe uma única forma de conduzir uma "terapia do psicológico", e isso se dá em função da existência de diferentes perspectivas teóricas dentro da Psicologia, seja porque o modelo mais tradicional de psicoterapia mantém com o modelo médico uma relação de proximidade. Neste modelo há entre médico e paciente uma relação de distanciamento, e o paciente submete seu adoecimento ao saber quase onipotente do médico.

Logicamente que este modelo está em falência mesmo dentro da medicina, pois muito se fala em humanização do atendimento, humanização capaz de produzir circunstâncias que aumentam as chances do paciente aderir ao tratamento. Sendo assim, fica patente a importância do estabelecimento de uma relação profissional em que a expressão das emoções acaba se transformando em reforços que fortalecem os comportamentos de colaboração por parte do paciente.

No princípio da clínica psicoterápica, e a Psicologia deve sua inserção na clínica à Psicanálise, o psicoterapeuta se ausenta da relação para dar lugar à palavra. Vem daí o uso do famoso divã, uma espécie de sofá em que o paciente se deita e fala de suas emoções livremente. O psicoterapeuta para deixar que as emoções fluam naturalmente assume um lugar atrás do divã, pois o principal ator neste momento é a palavra, e é ela que levará a elucidação dos sentidos ocultos atrás de cada expressão emocional, dos sentidos que levariam aos labirintos de um suposto "inconsciente".

É típico deste tipo de condução do processo psicoterápico a "apatia" emocional do psicoterapeuta, o que colabora para que a relação terapêutica se torne em algo desprovido de afetividade. Mas a palavra pode continuar tendo o seu lugar de destaque sem que para isso seja sacrificada a relação terapêutica. O divã não é uma regra, e talvez seja muito mais uma exceção, pois tudo que se espera numa psicoterapia é acolhimento, acolhimento que gera a disposição para que o portador do sofrimento fale daquilo que lhe traz desconforto.

Ninguém busca a psicoterapia para dizer que está feliz. Ninguém pagaria um profissional para dizer: "olha, minha vida está ótima, e foi muito bom compartilhar isso com você!" Busca-se a psicoterapia no intuito de se conseguir produzir alterações naquelas circunstâncias geradoras de sofrimento. Se o sofrimento estabelece as circunstâncias favoráveis para a busca de ajuda profissional, ele pode ser também o motivo para que alguém desista de ser ajudado, desde que não se sinta devidamente acolhido, o que transforma a relação em algo bastante aversivo.

Estímulos aversivos geram comportamento de fuga. Desistir da ajuda é fugir, e a fuga pode tanto ser motivada pela aversividade da relação terapêutica, quanto pela aversividade do próprio sofrimento que precisa ser narrado, e ao ser narrado novos estímulos aversivos são gerados, e por sua vez estes estímulos aumentam a probabilidade de comportamentos de fuga. Depreende-se daí a ênfase numa relação que promova acolhimento, o que significa que o profissional pode e deve ser empático, pode e deve demonstrar compaixão, entendendo compaixão como um esforço em se colocar no lugar daquele que sofre.

Outro aspecto importante da relação que se estabelece entre profissional e cliente é a reciprocidade. Isso significa que expressões emocionais podem dar um feedback sobre o tipo de situação relacionada ao que é sentido tanto pelo cliente quanto pelo terapeuta. A relação terapêutica não é diferente de outros tipos de relações vividas fora do âmbito do setting clínico. Sendo assim, quanto mais natural for a relação terapêutica, mais o ambiente terapêutico vai imitar o ambiente do cliente, favorecendo, desta forma, a emissão de comportamentos clinicamente relevantes, de comportamentos que só poderiam ser observados em ambiente natural.

Se no seu ambiente natural o cliente experimenta emoções em suas relações, por que não haveria de experimentá-las na relação terapêutica? Por que a relação terapêutica não pode favorecer a ocorrência de comportamentos emocionais que ocorrem em ambiente natural? Ela não só pode como deve favorer a ocorrência destes tipos de comportamentos, o que acaba gerando informações valiosas sobre as contingências de reforço presentes na vida do cliente.

Os sentimentos do terapeuta não precisam ser ocultados do cliente, pois assim ele poderá se conscientizar do efeito que geralmente os seus comportamentos têm sobre as pessoas que fazem parte do seu convívio. Portanto, a relação terapêutica é um espaço de manifestação de calor humano, pois ela não se difere de outros tipos de relações, a não ser pelo fato de ser profissional, tendo assim o propósito muito claro de promover o reestabelecimento da parte que sofre.

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sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Os Sintomas da Vida Moderna


Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Não sei se acontece só comigo ou se com você leitor essa é também uma prática recorrente. Refiro-me as queixas que têm como foco principal a carência. Tenho visto muitas pessoas se queixarem de se sentirem carentes e sozinhas. Fico imaginando o quanto estas queixas podem estar relacionadas ao modo de vida imposto pelos tempos modernos em que vivemos.

Uma coisa é fato: desde que o Homem é Homem que ele propavelmente sente carência. A carência não é um sentimento exclusivo dos tempos modernos, e seria muito grosseiro fazer tal afirmação. No entanto, fico aqui a conjecturar o quanto a modernidade com todas suas tecnologias que prometem facilitar a comunicação , que promentem promover a socialização, têm de fato cumprido com o esperado. Também não é a tecnologia a culpada, mas certamente o uso que dela se faz acarreta em diversos impactos sobre os seus usuários.

O isolamento e/ou o enclausuramento digital, algo que era inimaginável há algumas décadas, tem se tornado cada vez mais comum. Pessoas gastam horas de suas vidas na frente do computador. E parte significativa destas horas na frente do computador são gastas com as redes sociais. O quão social são de fato as redes sociais? Se a pessoa que faz uso das redes sociais já era alguém que tinha vida social, certamente estas redes vão produzir um acréscimo, ou seja, serão apenas mais uma alternativa a ser usada para expansão dos contatos sociais.

Por outro lado, se a pessoa tem um histórico de dificuldades no estabelecimento de contatos sociais, as redes sociais podem funcionarem como uma fuga. Esta fuga pode provocar isolamento social, isolamento social acarreta em perda de importantes estímulos reforçadores, com isso surge o sentimento de carência. Contudo, é incrível que mesmo os mais sociáveis se queixam de carência. Então vamos tentar entender o que é a carência.

Não precisa dizer que a carência é um sentimento, e geralmente este se manifesta por meio de uma sensação de vazio, de uma sensação de que está faltando alguma coisa. De fato falta alguma coisa quando se sente carência, pois a carência enquanto sentimento é produto de uma operação comportamental chamada de privação. Mas privação de que? Privação de estímulos reforçadores, geralmente estímulos de origem social.

Privação e modernidade, qual a relação entre ambos? A vida moderna nos impõe um alto padrão de competitividade, aliás a competitividade é a marca padrão do sistema de produção capitalista, o que exige de todos nós um alto ciclo de atividades, ou seja, para que possamos competir e sobreviver no mercado de trabalho e assim sermos capazes de fazer a manutenção de nossos padrões de vida, temos que inevitavelmente nos debruçarmos sobre o trabalho, temos que literalmente correr atrás do ganha pão.

Com isso acaba sobrando muito pouco tempo para o lazer, e o lazer mais barato e menos custoso de ser colocado em prática é aquele ofertado pelas redes sociais. A correria da vida moderna priva-nos de muitos reforçadores importantes que muitas vezes tentamos buscar nas redes sociais. O perigo é que os contatos sociais reais sejam substituídos pelos contatos sociais virtuais. Na frente do computador e trancados dentro de nossas casas sentimo-nos muito mais seguros.

A segurança do lar fornece-nos a possibilidade de evitarmos aborrecimentos, frustrações, pois a vida real, aquela em que não podemos simplesmente bloquear ou excluir a pessoa como fazemos nas redes sociais quando nos sentimos aborrecidos, é cheia de desafios. E estes desafios quando superados fortalecem nossas capacidades de superação de obstáculos, de gestão de conflitos, de tolerância a frustrações etc. A vida real presentea-nos com imprevistos que nos dão as chances de ampliarmos as formas com as quais podemos operar no mundo, de modificarmos as nossas formas de existir, de nos tornarmos pessoas mais flexíveis e talvez mais amáveis, ou ao menos mais tolerantes.

Já as redes sociais nos oferecem a possibilidade de excluirmos aborrecimentos com apenas um clique. O preço que se paga para se livrar de aborrecimentos com um clique é o de ser aplacado pela sensação de carência. A carência não é o único sintoma da vida moderna. Um outro notável sintoma é a intolerância. As pessoas estão cada vez mais intolerantes, cada vez mais incapazes de resistirem a frustrações, não sabem lidar com imprevistos, não sabem consertar o que estragou, pois é mais fácil comprar uma mercadoria nova. As pessoas estão acostumadas às coisas prontas. É muito mais fácil chegar num restaurante e já encontrar a comida pronta do que se dar ao trabalho de cozinhar.

Não sabendo fazer e se acostumando a adquirir pronto, as pessoas vão sendo modeladas para se tornarem imediatistas. Imediatismo, outro sinal dos tempos modernos. Se alguém liga para o celular do outro e cai na caixa postal isso se transforma em um inferno existencial (e aqui a rima não foi proposital... rsrsrs!), pois o imediatismo impede a pessoa de entender que nem sempre tudo que se quer de fato se consegue alcançar no momento em que se deseja. Há sonhos que precisam ser adiados, pois requerem planejamento, mas planejamento pode significar atraso na obtenção de certos reforços, algo que muitos não suportam, pois tendo sido modelados pelo "frenezi" da vida moderna querem resultados imediatos. Todavia, nem tudo pode ser obtido com a imediaticidade com o qual se deseja.

Por outro lado o planejamento pode aumentar as chances de que no futuro os reforços que se deseja obter sejam de fato obtidos. É o imediatismo versus os resultados a longo prazo, ou numa linguagem um pouco mais técnica, são as contingências imediatas versus as contingências postergadas. O efeito das contingências imediatas são muito mais visíveis, muito mais paupáveis. Desta maneira estas contingências podem se transformarem em armadilhas que fazem com que as pessoas que são expostas a elas se tornem reféns de um estilo de vida que só será modificado quando as próprias contingências forem modificadas.

Fica a pergunta: que mundo estamos contruindo para a humanidade? Podemos introduzir modificações nas contingências de reforço presentes neste mundo, de modo que as pessoas sejam menos reféns de estilos de vida que escravizam e se tornem portanto mais felizes? Se alguém tiver alguma sugestão que opine!


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terça-feira, 31 de julho de 2012

Pular, pular: se expondo a novas experiências

 

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Se não conseguir assistir o vídeo clique no seguinte link para assisti-lo no YouTube: http://www.youtube.com/watch?v=9n-heE1F5Wo

Se você viu o vídeo acima deve ter percebido como às vezes a vida dá reviravoltas, e estas reviravoltas criam circunstâncias favoráveis para que possamos viver novas experiências, e com a vivência de novas experiências temos a oportunidade de experimentarmos novos sentimentos. Simples assim! Simples como dizer "oi". Não resisti ao jargão de certa operadora de celular! Rsrsrsrs...

O vídeo mostra um cordeiro que muito orgulhoso de sua felpuda lã, já ao raiar do dia começava a sapatear. Com isso chamava a atenção dos bichos que moravam nas circunvizinhanças. Todos ficavam impressionados com o sapateado do cordeiro, e logicamente direcionavam toda sua atenção para ele. Ops, aqui se vê em vigor uma operação de reforçamento positivo. O sapatear tinha como consequência obter atenção dos vizinhos. Quanto mais davam atenção, mais o cordeiro sapateava e mais se sentia orgulhoso.

Isso levou o cordeiro a formular uma regra para descrever as contingências de reforço as quais estava exposto. Falando menos tecnicamente, isso levou o cordeiro a formular uma regra de conduta. Esta regra o fazia entender que o que chamava atenção da bicharada era sua felpuda lã, e sapatear era uma forma de exibir o seu visual, ou seja, para o cordeiro o motivo para continuar sapateando era poder exibir sua lã, tanto é verdade que quando foi tosqueado ele perdeu toda a motivação para sapatear.

Está certo que a lã poderia exercer certo fascínio sobre o comportamento de observar e dar atenção da bicharada, mas este fascínio também era obtido pelo sapatear do cordeiro, tanto é verdade que os bichos imitavam-no e com ele sapateavam. A lã era um elemento a mais, um estímulo que contribuía para que a contingência de reforço fosse potencializada, ou seja, era uma espécie de "plus" que somado ao sapateado tornava a circunstância mais atraente, mas não era ela o elemento mais importante, caso contrário os bichos não imitariam o comportamento de sapatear, ficando apenas a observar a beleza do cordeiro.

O sapatear dos bichos é um indicativo de que o sapatear do cordeiro era o estímulo mais importante da contingência, ou seja, era o elemento mais importante daquela circunstância. Outro indicativo é que posteriormente o cordeiro conseguiu obter a atenção dos bichos com o comportamento de pular aprendido com o "coelho". Depois da aprendizagem do comportamento de pular a lã já não era mais importante, pois o cordeiro aprendeu obter reforço positivo (atenção dos bichos) através do pular, tanto não era importante que o cordeiro não mais se importava em ser tosqueado.

O cordeiro aprendeu a obter a atenção dos que estavam próximos com aquilo que ele era e não com aquilo que aparentava. A aparência ficou em segundo plano. O comportamento de pular se tornou intrinsicamente reforçador, ou seja, transformou-se em uma fonte de prazer, seja pela estimulação sensorial produzida, seja pela capacidade de conseguir atenção. As novas circunstâncias vividas a partir do encontro com o "coelho" geraram uma nova aprendizagem que se transformou em uma nova regra de conduta, e esta pode ser assim traduzida: agora o que importa é ser feliz independente da aparência.

O cordeiro aprendeu que o importante era ser feliz com aquilo que ele sabia fazer, ou seja, que sua felicidade dependia do seu agir no mundo e não de sua aparência. Mas tudo isso só foi possível porque ele foi exposto a novas contingências de reforço, ou em outras palavras, porque ele se permitiu viver novas experiências. Ao viver novas experiências acabou experimentando novos sentimentos que se sobrepuseram àqueles sentimentos gerados quando do primeiro tosqueamento.

O primeiro tosqueamento gerou perda de reforçamento positivo. Com isso o cordeiro fechou-se em si mesmo, ou seja, todos seus comportamentos de extroversão foram submetidos a extinção. Com a extinção surgiram sentimentos como tristeza, angústia etc. Digamos que se analisássemos o comportamento do cordeiro a partir de sua aparência (topografia), não teríamos dificuldades para rotulá-lo como "depressivo". Mas a partir de uma análise funcional descreveríamos os sentimentos vividos pelo cordeiro como consequência do processo de extinção de alguns de seus comportamentos.

Portanto, a história nos deixa uma lição. Que lição é essa? Devemos continuamente nos darmos a oportunidade de vivermos novas experiências. Se quisermos mudar nossos sentimentos, só conseguiremos esta façanha mudando as circunstâncias responsáveis pela ocorrência dos mesmos. O cordeiro teve seus sentimentos mudados porque mudaram também as circunstâncias  responsáveis por estes sentimentos. Sentimentos não são causas de comportamento. Sentimentos são comportamentos também, sendo, portanto, determinados pelas contingências de reforço, e só quando estas se alteram é que os comportamentos se modificam, inclusive os comportamentos emocionais.

Uma outra lição interessante é que nossa felicidade não depende exclusivamente de nossa aparência. O mundo capitalista que vivemos quer nos fazer acreditar nesta verdade para vender cosméticos e outras tantas mercadorias. Há inclusive milhares de pessoas que se tornam reféns dos padrões de beleza estabelecidos pela mídia, dependência que gera contingências de reforço que produzem sofrimento e desajustamentos, desajustamentos que às vezes chegam a extremos como os da Anorexia e Bulimia Nervosa.

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quarta-feira, 25 de julho de 2012

Depressão: que bicho é esse?

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Para você testar o quanto o tema é mais comum do que se imagina, sugiro que faça uma busca no Google usando a palavra "depressão". A busca retornará inúmeras páginas. Desde páginas de laboratórios de fármacos para tratamento da depressão, passando por depoimentos de pessoas que sofreram algum episódio depressivo em suas vidas, até artigos científicos sobre o assunto.

Mesmo entre os artigos científicos não será incomum encontrar diferentes abordagens ao se tratar do tema "depressão". Desde abordagens mais biologizantes, que consideram a depressão um transtorno de humor causado exclusivamente por desequilíbrios bioquímicos, até abordagens mais psicologizantes, que consideram a depressão uma doença relacionada com complexos emocionais mal resolvidos.

Nem tanto ao céu, nem tanto ao mar. Na determinação de episódios depressivos estão diversas causas. Há causas biológicas, mas estas sozinhas são incapazes de fazerem o episódio se instalar e se manter. Se desequilíbrios bioquimicos podem facilitar a ocorrência de episódios de depressão, estes geralmente só podem ser averiguados quando eventos psicológicos atuam como um gatilho, de modo que se possa hipotetizar sobre sua existência, ou seja, certos eventos psicológicos pelas suas próprias características atuam como fatores que requerem a participação de certas substâncias, substâncias que chamamos neurotransmissores e que agem na transmissão de impulsos nervosos, e na falta destas substâncias o organismo pode não responder adequadamente, produzindo assim estados afetivos comuns aos quadros de depressão.

Trocando em miúdos, a coisa funciona mais ou menos assim. Há certas substâncias que são chamadas neurotransmissores. Estas atuam na transmissão dos impulsos nervosos. Impulsos nervosos são pequenas descargas elétricas que ocorrem no sistema nervoso. O impulso nervoso é a forma através do qual o sistema nervoso se comunica com o restante do corpo. Na ausência de certos neurotransmissores ocorrerão alterações no funcionamento do sistema nervoso, aumentando assim a probabilidade de certas modificações emocionais comumente encontradas nos quadros de depressão.

A medicação é utilizada para reequilibrar estas substâncias chamadas neurotransmissores. No entanto, é bom que se esclareça que jamais a medicação extinguirá os eventos psicológicos responsáveis pelo episódio depressivo. Em outras palavras, a medicação amenizará aquelas alterações emocionais comuns aos quadros depressivos: angústia, ansiedade, tristeza etc. Todavia, a medicação jamais produzirá alterações comportamentais que coloquem um fim nos eventos psicológicos, eventos que podem ter acionado o gatilho bioquímico que produziu o quadro de depressão.


Sendo assim, é recomendável que a pessoa acometida de um quadro depressivo procure tanto acompanhamento psiquiátrico, quanto acompanhamento psicológico. Com o acompanhamento psiquiátrico ela fará uso da medicação correta para lidar com o quadro vivenciado. Já com o acompanhamento psicológico a pessoa terá a oportunidade de efetuar mudanças naqueles comportamentos responsáveis pela manutenção do quadro de depressão, sobretudo, ela aprenderá a identificar as circunstâncias que atuam na determinação destes comportamentos.

Seria muito simplista reduzir as causas da depressão a fatores bioquímicos. Estes são alguns dos fatores, mas não são os únicos. Há muitos eventos comportamentais que podem produzir alterações emocionais como aquelas experimentadas nos quadros de depressão, ou seja, os comportamentos têm consequências, por sua vez estas consequências podem contribuir para a instalação de perturbações emocionais as mais diversas, inclusive as perturbações reunidas sob o rótulo de "depressão".

Desta forma é lícito afirmar que a depressão é um evento comportamental na medida em que está relacionado a modos de agir no mundo, modos que podem produzir alterações emocionais, e por sua vez estas alterações provocam interferências as mais diversas na vida cotidiana, interferências que se fazem notar através de diferentes comportamentos: falta de motivação, choro constante, apatia, insônia, tristeza, irritabilidade, pessimismo, dificuldade de concentração, pensamentos negativos etc. Sendo um evento comportamental que se faz notar por diferentes comportamentos, este para ser tratado precisa ser analisado como todo evento comportamental, ou seja, em função das relações que estabelece com certas circunstâncias ambientais responsáveis por sua ocorrência e manutenção.

Pode ser que os "comportamentos depressivos" sejam o veículo de comunicação encontrado por uma pessoa para comunicar ao seu sistema familiar que precisa de atenção. Não é incomum encontrar entre os depressivos pessoas que por dificuldades de se expressarem verbalmente, encontram em outros comportamentos, como os "comportamentos depressivos", meios para se comunicarem com o sistema familiar. A questão é que a pessoa e nem o sistema familiar têm consciência disso, o que geralmente contribui para a manutenção dos "comportamentos depressivos". Então, neste caso a depressão estaria relacionada a um déficit no repertório de comportamentos de expressividade emocional, o que priva a pessoa de reforços sociais importantes, gerando assim embotamento emocional.


Logicamente que nem todos os casos de quadros depressivos têm relação com déficits nos repertórios de interação social. Cada caso precisa ser analisado individualmente. Há casos em que episódios depressivos têm relação com eventos estressantes como a morte de um ente querido, a perda de um emprego, o fim de um relacionamento etc. Em todos estes casos os eventos estressantes vão atuar modificando as circunstâncias comuns ao cotidiano, gerando assim perda de reforçameto positivo, e como consequência alguns comportamentos podem entrar em extinção, ocasionando assim sentimentos típicos dos quadros depressivos.

O importante é que a pessoa acometida de um quadro depressivo procure o tratamento adequado, pois desta forma ela conseguirá introduzir em sua vida modificações que certamente contribuirão para amenizar ou extinguir aquilo que lhe aflige. Sobretudo, é importante saber que há tratamento, no entanto, cada caso poderá ser conduzido de uma maneira diferente, pois a história de instalação e manutenção do quadro logicamente terá relação com a própria história de vida, e esta última é única e intransferível.

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sábado, 23 de junho de 2012

O Papel do Trabalho de Conclusão de Curso na Formação do Aluno de Graduação

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

O trabalho de conclusão de curso (TCC) é algo temido pela grande maioria dos alunos de graduação, seja porque muitos chegam ao final do curso sem conhecer os passos que levam à construção de conhecimento científico, ou porque o recebimento do diploma depende da aprovação de seu trabalho de conclusão de curso, o que transforma este que deveria ser um momento que coloca o aluno em contato com o processo que envolve a produção de conhecimento científico em uma potencial fonte de punição.

Pena que se deixa para o fim da graduação a realização do TCC. Digo isso porque o contato com o processo que envolve a produção de conhecimento científico, algo que o TCC torna possível, deveria ocorrer ao longo de toda a formação. Como não ocorre o TCC passa a ser o vilão da maioria dos alunos que se encontram no último ano de sua graduação. Também conhecido como Monografia, o TCC é uma excelente oportunidade para se criar circunstâncias favorávies para a modelagem de comportamentos científicos, ou melhor dizendo, de comportamentos que possam favorecer a produção de conhecimento científico. Não é esse o papel da universidade, ou seja, além de formar profissionais ela também não deve formar cientistas?

Se fosse para utilizar uma linguagem behaviorista radical, o TCC cria contingências de reforço que possibilitam a consequenciação de comportamentos que correlacionam causas e efeitos por reforços positivos, gerando assim, comportamentos de observação, correlação de variáveis (raciocínio lógico), levantamento de dúvidas etc. Se observarmos bem todos estes são comportamentos que devem fazer parte do repertório de qualquer cientista. É interessante ir à raiz da palavra "monografia". Formada pelas palavras gregas monos (um, unidade) e graphein (escrita), monografia significa um estudo sobre um único assunto.

Se é um estudo sobre um único assunto, isso quer dizer que não se trata de um estudo qualquer. Neste caso, trata-se de um estudo sobre um objeto de estudos previamente delimitado pelo pesquisador, sendo este o primeiro passo de qualquer pesquisa que pretenda ter o caráter de científica. De modo bastante sintético a pesquisa científica percorre os seguintes passos: delimitação do objeto de estudos, levantamento bibliográfico, construção de hipóteses explicativas, escolha de metodologia apropriada, testagem das hipóteses e produção de conclusões. Todos estes passos geralmente são percorridos ao se confeccionar uma monografia, o que evidencia o quão importante é construir uma monografia, pois ela ensina ao aluno como fazer ciência, algo que ele deveria aprender não somente no final da graduação, mas agora não vem ao caso refletir sobre as deficiências do ensino superior brasileiro, que em função de suas limitações não coloca o aluno de curso superior em contato com a lógica que permeia a construção de conhecimento científico.


Percorramos de modo bastante sintético cada um dos passos que fazem parte da empreitada que leva à construção de conhecimento científico, passos acima citados e que geralmente são percorridos ao se produzir uma monografia. Delimitação do objeto de estudos. Diz respeito ao recorte da realidade ou delimitação do universo da pesquisa, ou ainda a escolha do fenômeno ou grupo de fenômenos que serão o alvo da investigação. Esta delimitação se faz importante por vários motivos, mas principalmente porque dela dependerá as relações de causa e efeito que o estudo precisa estabelecer para explicar o comportamento do fenômeno que é o alvo da investigação.

Levantamento bibliográfico. O conhecimento científico é cumulativo, portanto, uma pesquisa pode se beneficiar de outros estudos realizados anteriormente por outros pesquisadores. O levantamento bibliográfico pode ajudar a redimensionar o universo da pesquisa, como também produzir informações que vão alimentar a criação de hipóteses explicativas. Construção de hipóteses explicativas. Hipóteses são explicações temporárias para o comportamento do fenômeno que é alvo da investigação. Podem ou não serem corroboradas, ou seja, podem ou não serem confirmadas ao fim do estudo. Sendo assim, são norteadores importantes para a realização da pesquisa e serão determinantes na hora da escolha da metodologia apropriada para a realização do estudo.


Escolha da metodologia apropriada. A escolha da metodologia implica em pensar a forma de se aproximar do objeto de estudos, em pensar como será a relação entre sujeito e objeto. No caso das ciências humanas e sociais esta definição é extremamente importante, já que a forma do sujeito da pesquisa se relacionar com seu objeto de estudos exige cuidados adicionais, uma vez que este sujeito geralmente faz parte do universo do objeto e seu comportamento pode alterar o fenômeno estudado. Este também é o momento para se pensar nos instrumentos que permitirão o levantamento de informações sobre o objeto de estudos. São estas informações que subsidiarão as conclusões da pesquisa, permitindo a confirmação ou não das hipóteses.

Testagem das hipóteses. A testagem pode variar em função do tipo de estudo. Por exemplo, estudos experimentais exigirão a criação de arranjos experimentais e de condições apropriadas para a construção destes arranjos, e toda testagem dependerá consequentemente da forma como tais arranjos serão arquitetados. Então o tipo de estudo determinará a forma de se testar as hipóteses. Com a testagem das hipóteses a pesquisa produzirá informações que conduzirão às conclusões a respeito das relações de causa e efeito produzidas durante a fase de testagem.

Talves outros passos possam ser adicionados aos que foram acima citados e analisados. Todavia, estes fornecem uma boa representação de como funciona o processo de produção de conhecimento científico, mas que pena que na maior parte das universidades brasileiras o contato com este processo aconteça somente no momento da confecção dos trabalhos de conclusão de curso, e no mínimo isso revela uma deficiência cultural das terras tupiniquins: pouco investimento no fazer científico. Não é por acaso que boa parte de nossos cientistas vão produzir ciência em outros países.

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sexta-feira, 22 de junho de 2012

O Valor da Pesquisa Bibliográfica

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Desprezar o valor da pesquisa bibliográfica é um erro que não pode ser cometido por nenhum pesquisador. O motivo é ligeiramente simples: a ciência logra resultados de pesquisas feitas por outros pesquisadores, ou seja, o saber científico é um saber cumulativo, e é no mínimo um erro muito grosseiro desprezar o que outros tenham dito ou pesquisado sobre determinado assunto.


Não é incomum encontrar pessoas que desprezam o valor da pesquisa bibliográfica, principalmente no âmbito das Ciências Humanas e Sociais, o que é uma incoerência, pois nestas áreas do saber se produz muito conhecimento a partir de revisões conceituais, revisões que geralmente têm o objetivo de elucidação de conceitos que se fazem relevantes para o entendimento de determinado fenômeno.

Qual a importância dos trabalhos de revisão conceitual? Estes se debruçam sobre conceitos na tentativa de demonstrarem suas aplicabilidades ou mesmo para tornar clara sua compreensão, como também mostrarem suas relações com outras áreas do saber, possibilitando assim a construção de pontes entre estas diferentes áreas. A elucidação de conceitos permite ainda a melhor compreensão dos fenômenos aos quais eles se aplicam, tornando possível a pesquisa aplicada, ou seja, a pesquisa que tenta compreender e/ou explicar determinadas parcelas da realidade a partir da utilização de um corpo conceitual.


Pesquisa aplicada é diferente de pesquisa básica. Pesquisa aplicada parte de um corpo conceitual mais ou menos consolidado, e utliza-o na compreensão e/ou explicação de certos recortes da realidade. Já a pesquisa básica pretender elucidar as relações de determinação e/ou funcionalidade dos fenômenos estudados, produzindo assim hipóteses explicativas que vão se transformar em teorias na medida que forem sendo corroboradas. Por sua vez, teorias são formadas por um corpo conceitual, e os conceitos são nada mais nada menos do que descrições dos fenômenos ao qual fazem referência. Estas descrições são utilizadas para explicarem o funcionamento destes fenômenos.

De modo bastante grosseiro, por meio da pesquisa básica se chega a descrições das "leis" que regem o funcionamento de determinado fenômeno. Uma vez descrita, a lei pode ser aplicada a diversas situações em que o fenômeno ao qual ela faz referência acontece, e isso é pesquisa aplicada. Mas, tanto a pesquisa básica, quanto a pesquisa aplicada podem gerar discussões sobre a eficácia dos conceitos na descrição dos fenômenos ao qual fazem referência, e estas discussões podem ser bastante proveitosas no sentido de elucidar os fundamentos epistemológicos que dão origem a descrição conceitual, ou seja, no sentido de tornar claro os procedimentos metodológicos que possibilitaram a construção dos conceitos.


Esclarecido os procedimentos metodológicos que possibilitaram a construção de um determinado corpo conceitual, outros cientistas podem reproduzi-los com o intuito de submeter a prova este mesmo corpo conceitual, e isso é chamado de validação. Então, uma característica que deve definir o conhecimento científico é sua capacidade de validação, ou seja, a capacidade que tem de ser submetido à prova. Neste processo de submissão à prova, a discussão conceitual, que geralmente se faz por meio de revisões conceituais e pesquisas bibliográficas é extremamente importante e salutar, pois alimenta o processo de reflexão que faz parte da empreitada de construção do conhecimento científico.

Sendo assim, as pesquisas bibliográficas e de revisão conceitual devem ser incentivadas, na medida que puderem contribuir para o processo de reflexão, processo esse que alimenta a empreitada de construção de conhecimento científico. Se este tipo de pesquisa pode contribuir para alimentar a produção de conhecimento científico, deve, então, ser considerada como um meio interessante sobre o qual toda ciência se edifica, um meio que permite a elucidação dos procedimentos que fundamentam a difícil jornada de se produzir conhecimentos que mereçam o rótulo de cientificos.

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sábado, 5 de maio de 2012

O Ofício de Ser Professor

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Ver alunos do ensino superior cometendo erros primários de ortografia me faz desconfiar da qualidade do ensino num país que diz ser de todos: "Brasil um país de todos". Talvez alguns digam que criticar a educação seja o mesmo que "bater em cachorro morto". Cachorro morto é incapaz de reagir. Não quero bater em cachorro morto e nem mesmo bater na mesma tecla sobre a importância da educação na construção de um país melhor, de um país com mais oportunidades e mais acesso aos direitos fundamentais, sejam estes civis, políticos ou sociais.


Quero hoje falar sobre o ofício do professor, este que é uma das peças fundamentais no processo de ensino-aprendizagem. Todavia, ser professor num país que tem sucateado a educação não é nada fácil. O professor convive ao mesmo tempo com uma remuneração vergonhosa e com uma estrutura que não o permite planejar contingências que tornem possível a aquisição de comportamentos, por parte dos alunos, que sejam úteis tanto no contexto escolar e em outros contextos, mas principalmente em outros contextos. Esta é a função da educação, permitir a partir do arranjo de certas contingências a aquisição de comportamentos que sejam úteis em outros contextos. Sendo assim, a educação formal, aquela que é viabilizada por meio da escola, deve preparar o aluno para lidar com circunstâncias que ele vai encontrar fora do contexto educacional, deve permitir que certas habilidades sejam desenvolvidas, habilidades que permitirão a resolução de certos problemas que serão encontrados fora dos muros da escola.

Se o papel da escola é este que acima foi assinalado, é lícito dizer que ele se cumprirá mediante o ofício dos professores. São os professores os responsáveis pelo planejamento das contingências que modelarão os comportamentos que serão úteis para a resolução de problemas encontrados em outros contextos diferentes do contexto educacional. Logicamente que este planejamento deve estar assentado sobre alguns pilares. Gostaria de refletir sobre dois destes pilares que dizem respeito especificamente ao trabalho do professor. Estes pilares são: competência técnica e competência relacional.


Espera-se que o professor domine o conteúdo que ele vai lecionar, ou seja, que ele tenha as competências técnicas para modelar no repertório de seus alunos aquelas habilidades técnicas que devem ser adquiridas para que estes aprendam a resolver problemas bastante específicos. Esta verdade é principalmente aplicável ao ensino superior. Um professor de mecânica deve planejar contingências que permitam a modelagem de habilidades bastante específicas, habilidades que se referem ao universo dos motores. Os alunos deverão entender como funciona um motor, devem saber montá-lo e desmontá-lo, substituir peças etc.

Mas num país em que os professores são mal remunerados, surge um fenômeno bastante curioso: professores lecionam conteúdos que eles não têm nenhum domínio. Os professores precisam sobreviver, e acabam aceitando lecionar conteúdos que não dominam, pois esta é a forma de aumentarem os seus rendimentos. Esta realidade se faz presente em todos os níveis de ensino: fundamental, médio e superior. A consequência disso? Vocês podem imaginar... As habilidades que deveriam ser desenvolvidas acabam não sendo desenvolvidas. Isso perpetua um ciclo pernicioso, pois parte destes alunos se transformam no futuro em professores... Outra parte vai para o mercado de trabalho tradicional, mas este acaba selecionando os mais habilidosos. E os menos habilidos e competentes? Bem, estes têm destinos os mais diversos.


No entanto, existem professores que são competentes, ou seja, dominam os conteúdos técnicos, contudo, são um desastre no ofício de estabelecerem relações saudáveis com seus alunos. Suas relações são sempre mediadas por muito controle aversivo. Certamente o resultado do uso de controle aversivo não é dos melhores... Como planejar contingências que permitam a modelagem de certas habilidades com base em controle aversivo? O controle aversivo acaba gerando comportamentos que concorrem com as contingências que deveriam permitir a modelagem daquelas habilidades que serão úteis em contextos a serem encontrados fora do ambiente escolar.

Professores com poucas habilidades sociais se tornam estímulos aversivos potenciais. Ao entrarem em sala eliciam respondentes de mal estar e operantes de fuga, esquiva e contracontrole. Evasão escolar é um exemplo de comportamentos de fuga e esquiva. Depredação do patrimônio escolar é um exemplo de comportamento de contracontrole. Boicotar as aulas de um certo professor é um outro exemplo de comportamento de contracontrole. Nosso sistema de ensino precisa de professores competentes tecnicamente e relacionalmente, de professores que tenham domínio sobre os conteúdos que lecionam, mas que também sejam capazes de se relacionarem bem com seus alunos.

Se relacionar bem com os alunos também é importante para a potencialização do processo de ensino-aprendizagem. Relacionamentos aversivos geram efeitos emocionais colaterais que acabam interferindo com a aprendizagem. Geram também comportamentos os mais diversos, inclusive de contracontrole, comportamentos de atacar com punições e ameaças de punições as fontes de controle aversivo, fontes institucionalizadas no papel exercido pelo professor. E muitas vezes esse contracontrole que tem como meta o professor, faz com que este seja submetido a fontes de estresse. Por sua vez o estresse acaba provocando adoecimento. Professor que usa controle aversivo estará sujeito também a contracontrole aversivo.


Outra questão importante é que o professor é modelo de comportamento. Se suas estratégias de ensino estão baseadas em controle aversivo, acaba ensinando para seus alunos por modelação que o controle aversivo é a forma mais eficaz de se obter o que quer. Professor que usa punição ensina seus alunos também a usarem punição, e muitas destas punições podem ter como alvo o professor e o sistema educacional. A palmatória foi abolida, mas tem muitos professores que por não terem as competências técnicas ou relacionais, usam notas para ameaçarem seus alunos, usam controle aversivo para conseguirem exercer autoridade.

A melhor forma de exercer autoridade é cativando, é estabelecendo alianças. Fazer inimigos é gerar fonte de estímulos aversivos que retroagem sobre quem as criou. Sala de aula não é lugar para se criar inimizades, não é lugar para controle aversivo. Sala de aula é espaço para aprendizagem, e a aprendizagem ocorrerá naturalmente e sem efeitos emocionais colaterais nocivos se comportamentos forem consequenciados com reforçamento positivo.

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